O ano de 2019 – para mim – foi bastante sofrível em termos cinematográficos. E isso foi assim do começo ao fim do ano: de Vingadores Ultimato, It 2, Capitã Marvel até o X-Men: A Fênix Negra. Todos os filmes me pareceram bastante previsíveis, repetitivos ou com um desenvolvimento meio confuso e enrolado. A unica exceção foi o Coringa, interpretado por Joaquim Fênix.
Confesso que entrei na sala de cinema sem muitas expectativas, e mesmo antes de entrar no Cinema já esperava um filme fraco e sem vida. Contudo, surpreendi-me com um filme totalmente diferente e fora das fórmulas prontas de ação ou as piadas que cortam momentos de tensão ou heroísmo. Nada disso!
O Coringa de Joaquim Fênix é um convite que nos leva a percorrer o confuso labirinto mental do personagem: algo que pode ser relativamente perigoso e até mesmo desconfortável para nós, pois o Coringa de Fênix não é um psicopata inteligente e irônico como o de Hannibal Lecter ou mesmo o psicopata anarquista e caótico do Coringa de Heath Ledger – que estão do lado de “fora” no filme, ou seja, não percorremos a mente destes personagens, mas os acompanhamos em um enredo ou numa narrativa “externa”.
Bem ao contrário disso, Coringa não é um filme de terror, violência, heroísmo ou de ação: trata-se muito mais de um filme psicológico que mostra um homem entristecido, doente e enlouquecido, que sofre de psicoses e delírios. E, de certa forma, todo o seu meio – o seu ambiente em torno – também parece doente, como um reflexo de sua alma.
De qualquer forma, pode-se dizer que o enredo do filme é o próprio universo psicológico e imaginário do personagem. Não que o “ambiente externo” não seja relevante: mas é que toda a linha narrativa de fundo – que envolve o personagem ao universo de Gotham e aos membros da família Waine – está submetida ao desenvolvimento do personagem e na exploração e exposição de sua mente, desde sua situação psicológica presente, as possíveis origens de seu estado psicológico e as consequências de seus atos. Nós acompanhamos a loucura do personagem que é alçado em símbolo da desordem social – de maneira semelhante ao Coringa de Heath Leadger, que também simbolizava a desordem e anarquia na franquia de Nolan.
O filme possui uma grande variedade de aspectos que poderiam ser discutidos e tratados. Porém, talvez seja melhor deixar que você mesmo faça essa experiência e descubra a quantidade de temas interessantes que o filme pode levantar. (Só para dar uma dica, pense na relação entre o personagem, sua mãe e a ausência do pai em termos psicanalíticos… é disso que estou falando.)
O Coringa é um filme com enredo e desenvolvimento calmo para os padrões de hoje, sem as interrupções bruscas dos filmes de ação; trata-se de um filme calmo, que lembra a ambientação de alguns filmes de máfia dos anos 80, e no qual somos levados a acompanhar psicologicamente o personagem em suas profundezas. Por isso é um filme denso, que requer a nossa atenção e abertura.
Garanto que a experiência de assistir Coringa vale a pena não somente pela atuação do Joaquim Fênix, claro, mas também pelo filme em si mesmo, que consegue despertar nossa atenção para temas bastante atuais – sobre sociedade e política – como para a questão da realidade e este também é um ponto importante do filme: o que é fantasia e o que é realidade e até que ponto o universo da fantasia – a imaginação psicótica – pode distorcer e alterar a realidade? Coringa mostra um louco sendo elevado pela loucura da revolução social e se tornando um simbolo desta. Uma experiência marcante.
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